Home Office versus CLT, quem vencerá a batalha do Novo Normal?
Quando falamos da adoção perene da home office temos que considerar alguns pontos:
- Impacto no mercado imobiliário residencial e no mercado imobiliário corporativo.
- Impacto da CLT sobre esta forma de trabalho.
- CAPEX das empresas ou colaboradores na adaptação das residências.
- OPEX das empresas no custeio do espaço de trabalho nas residências.
- Balanço do uso da residência para home office e home schooling para todos os ocupantes.
Desde o início da recentemente pandemia muitas análises foram feitas por órgão de classe, revistas especializadas no mercado imobiliário, sindicatos, conselhos federais e regionais sobre o impacto da pandemia nos mercados imobiliários residenciais e corporativos.
O mercado imobiliário residencial surpreendeu a todos, com perdas mínimas em transações, pois a maioria das pesquisas relatou redução de no máximo 15% nas transações de compra de imóveis na planta.Isto também está explicado pela forte redução da taxa SELIC que motivou a oferta de novas formas de financiamento e a oferta de juros mais atraentes, na minha opinião uma oportunidade que vai durar pouco tempo e que irá beneficiar todos que comprarem ou renegociarem contratos neste momento. As locações superaram as médias históricas para o período.
Mas a grande surpresa ficou por conta do perfil de busca dos imóveis, que passaram de imóveis no centro, próximo de estações de metrô e das áreas próximas aos centros empresariais, para cidades do interior, do litoral, dos bairros periféricos, condomínios nos subúrbios, de bairros com diferenciais de contato com a natureza e condomínios clube. Em certas regiões o aumento da procura foi superior a 200%. O foco de amenidades também mudou para apartamentos com varanda, com maior metragem, com áreas de coworking, como exemplos.
A grande surpresa está no mercado de escritórios corporativos. A contrario senso, muitos relatórios apontam que o mercado corporativo de escritórios não tem previsão para adoção do home office de forma perene e geral para todos seus colaboradores, com a consequente redução de áreas locadas de escritórios. A maioria das empresas entende que esta opção é interessante, gera valor, mas também traz desafios inéditos que deverão receber atenção especial das empresas, governo, judiciário, entidades de classe e sindicatos, antes de serem extensivamente postas em prática. O que podemos notar é que as empresas irão manter seus funcionários nos escritórios das regiões CBD (Central Business District – Faria Lima, Paulista, Chucri Zaidan, Berrini, Itaim, Marginal Pinheiros) da mesma forma que vinham fazendo antes. A maioria das empresas se adequou provisoriamente as questões da COVID, mas devem voltar para a mesma forma de ocupação anterior.
O impacto da CLT na modalidade home office.
Antes da pandemia, o uso do home office era estimulado para áreas comerciais ou áreas técnicas cujos colaboradores passavam muito tempo fora da empresa. Ou seja, o home office não era exatamente trabalhar em casa, mas trabalhar em qualquer lugar, inclusive em clientes, cafeterias, hotéis e restaurantes – esta modalidade irá se manter. Outras áreas da empresa devem aderir a este modelo de forma parcial. Não será corriqueiro presenciarmos um gestor em uma cafeteria com uma mesa cheia de pastas, mas já vemos muitos profissionais de RH fazendo entrevistas de emprego em cafeterias, num ambiente mais tranquilo e descontraído.
Uma coisa é o uso provisório da residência dos colaboradores por conta da pandemia. Neste ponto todos se esforçaram ao máximo para superar a crise do COVID-19 com o menor impacto possível. Outra coisa é manter este modelo de forma perene.
A CLT tem pontos importantes a este respeito, pois o entendimento majoritário é de que o ônus do fornecimento de todo ferramental necessário para o desempenho das atividades laborais é do contratante, pois é exclusivamente deste último o risco do negócio, o que poderá gerar responsabilidade sobre o CAPEX e do OPEX necessários para a implantação do home office, que veremos mais abaixo.
CAPEX são todos os gastos que as empresas têm a título de investimentos, sejam eles para aquisição de máquinas, sejam para a adequação de imóveis para suas necessidades (reformas, compra de mesas e cadeiras, ar-condicionado, divisórias). Já o OPEX é o custo de manutenção deste espaço o que inclui aluguel, condomínio, IPTU, manutenção de sistemas, ar-condicionado, energia elétrica, banda larga, entre outros.
Devemos considerar os impactos diretos da CLT, das regulamentações específicas, dos acordos coletivos, OJs e etc, em temas como o controle de jornada, horas extras, entrada e saída, interjornada e intrajornada, subordinação. E tantos outros detalhes que já foram alvo de leis específicas, mas ainda geram distorções.
Vimos também outros absurdos, que num primeiro momento viraram memes engraçados, mas como ficarão estes erros no futuro? : estar numa reunião virtual de camisa e gravata, mas somente com roupas íntimas numa mesa de vidro? Erros como cachorros e gatos interrompendo as transmissões? Disputa de espaços com as crianças? Live com obras?
Os temas abaixo deverão receber atenção total das empresas antes da adoção do home office:
- Vestimenta (dress code) – qual deverá ser o mínimo aceitável nesta modalidade?
- Ergonomia no espaço de trabalho – cadeiras, mesas;
- Sigilo nas comunicações e documentos e sua integração com a Lei Geral de Proteção de Dados;
- Custeio das adaptações e da manutenção;
CAPEX na adaptação das residências.
Os impactos da CLT sobre este modelo serão fortes, pois o entendimento majoritário sobre a parte da CLT que prega é de que a responsabilidade do contratante o fornecimento de todos os recursos necessários para que o funcionário execute suas atividades. Como a empresa poderá tratar de forma adequada, ética mas com controle nos investimentos?
Isto irá colocar as empresas num dilema entre intervir diretamente no espaço íntimo de seus colaboradores, e na forma a adequá-lo às normas técnicas da ABNT e as previsões legais, acordos coletivos e individuais. Ou seja, a empresa deverá fornecer o mobiliário (mesa, cadeira, armários, prateleiras, arquivos), equipamentos (computadores, impressoras, scanners, telas externas, fones de ouvidos, teclados, mouse, entre outros), tecnologia (VPN, antivírus, conexão com internet, wifi, modem, nobreak, estabilizadores), proteção de dados (LGPD), e as adequações aos ambiente (iluminação, compartilhamento dos ambientes com outros familiares, cônjuges, filhos, animais)? A discussão passará também pela obrigatoriedade ou não da locação de parte do imóvel do colaborador para uso da empresa.
As empresas terão ainda que descomissionar os escritórios já contratados e adaptados dos atuais escritórios, que tem alto custo nas multas contratuais, no desfazimento do mobiliário e da devolução do imóvel da forma que foi recebido. Ainda deverão justificar o CAPEX realizado no início da locação e que agora não será mais utilizado. Como amortizar estes investimentos realizados?
OPEX no custeio do espaço de trabalho.
Na parte do OPEX as empresas deverão avaliar como irão indenizar o colaborador pelo uso de sua residência. E não será apenas “parte do custo da internet”, mas também o custo de metro quadrado utilizado para a montagem do escritório.
Um breve exemplo de um casal que agora trabalha em casa: Uma pessoa irá utilizar uma pequena mesa no próprio quarto, em detrimento de um móvel de TV, ou uma poltrona de leitura. O outro irá utilizar a mesa de jantar da família para instalar suas coisas. É justo que a empresa pague aluguel pelo espaço da escrivaninha e pela restrição de uso da mesa de jantar pela família? Este movimento já está em curso e precisa ser bem equacionado.
Para comparação de modelos, vamos tomar como exemplo a decisão da empresa entre o colaborador usar seu veículo próprio para trabalhar, usar taxi/ UBER ou alugar veículos. No caso de o colaborador usar seu próprio veículo já está pacificado que a empresa deverá indenizar o colaborador pelo uso do veículo com base no custo total deste, incluindo depreciação, manutenção, desgaste prematuro, combustível, seguro, impostos e taxas, com base em quilometro rodado a serviço da empresa. Este modelo deverá ser aplicado ao uso da residência para a implantação do home office.
Balanço do uso do home office e o home schooling entre os membros da família.
Sob o ponto de vista dos ocupantes, como fica a dinâmica de divisão de espaços e convivências, na administração das vídeo conferências? E cônjuges que trabalham em áreas conflitantes ou empresas concorrentes? Existem inclusive restrições legais para determinados cargos e empresas.
E no caso de famílias que terão que conviver com a escola em casa (home schooling), como adaptar os ambientes para que 3 ou 4 pessoas possam administrar suas tarefas e atividades?
O home office já existe há pelos menos 25 anos, e tem sido cautelosamente adotado por empresas e seus colaboradores, e deverão seguir desta forma no próximo ano, que será o tempo necessário para estas discussões, análises e decisões. Neste momento, a situação ganhou destaque e novo olhar da sociedade. Mas as instituições deverão trabalhar para viabilizar este modelo sensível de transferência do espaço de trabalho das empresas para os lares de seus colaboradores. Com certeza irá trazer melhor qualidade de vida para as famílias, maior produtividade, impacto positivo no meio ambiente e melhor controle e uso da infraestrutura e recursos disponíveis. Mas as empresas terão que avaliar a melhor forma de compartilhar este ônus com seus colaboradores e suas famílias.
Luis Fernando Gardel Deak
Advogado – OAB-SP 402.731 – Direito Digital, LGPD e Imobiliário
www.luisdeak.com.br – ld@luisdeak.com.br
O autor é Graduado em Direito pela UNIP, pós-graduando em Direito e Processo Civil pela EPD, especialista em direito digital e imobiliário. Foi Membro da Comissão de Direito Digital e Compliance da OAB-SP, Membro da Comissão de Direito Urbanístico da OAB-SP.
Graduado em administração de empresas, pós-graduado em marketing pela ESPM, MBA em gestão estratégica de negócios pelo ITA/ESPM, Formação em Black Belt em Lean Six Sigmas pela Fundação Vanzolini. Tem 25 anos de experiência no mercado de tecnologia da informação e consultoria empresarial.
Corretor de imóveis especializado em imóveis comerciais e corporativos (CRECI-SP 131.710-F), perito avaliador (CNAI 9.898), certificado CIPS pela NAR, membro do grupo de avaliadores imobiliários do CRECI-SP, conciliador na JUCON (Junta de Conciliação) da CEFISP (Comissão de Ética e Fiscalização Profissional) do CRECI SP. Experiência em transações imobiliárias de locação e vendas de espaços corporativos para escritórios, varejo e logística.